Intérprete de personagens inesquecíveis do cinema norte-americano, Val Kilmer morreu aos 65 anos. Sua vida foi retratada no comovente “Val”, documentário que pode ser conferido no Prime Video.
O ator morreu dia 1º de abril, em Los Angeles, na Califórnia, vítima de pneumonia, após dez anos de batalha contra um câncer de garganta.
Kilmer tornou-se um dos mais jovem alunos admitidos no Juilliard Drama Center de Nova York, aos 17 anos. Fez sua estreia na Broadway em 1983, na peça “The Slab Boys”, ao lado de Sean Penn e Kevin Bacon, e logo depois seu primeiro longa-metragem, a comédia besteirol “Top Secret! – Superconfidencial” (1984). Dois anos depois, viveu “Iceman”, apelido do rival arrogante de Tom Cruise no sucesso de bilheteria “Top Gun – Ases Indomáveis” (1986).
De porte atlético e carismático, foi o mocinho do longa de fantasia “Willow – Na Terra da Magia” (1988), produção de George Lucas onde conheceu, no set de filmagem, sua primeira esposa, a atriz inglesa Joanne Whalley, com quem teve dois filhos, Mercedes e Jack Kilmer. Ele contracenaria de novo com a atriz e esposa no thriller “Mate-me Outra Vez” (1989).
O filme seguinte traria Kilmer naquele que é, para muitos, seu maior papel. Sob a direção de Oliver Stone, ele está hipnótico no papel do poeta e vocalista Jim Morrison em “The Doors”, cinebiografia da famosa banda de rock californiana. Kilmer cantou com sua própria voz (mixada à de Morrison na pós-produção) e se jogou de corpo e alma — literalmente, pois se machucou ao pular sobre o público numa encenação de show — ao papel numa atuação eletrizante.

Descendente de cherokees, alemães, irlandeses e suecos, Kilmer retomou sua raízes indígenas no drama policial “Coração de Trovão” (1992), baseado em assassinatos reais investigados numa reserva Sioux. E em “Amor à Queima Roupa” (1993), escrito por Quentin Tarantino e Roger Avary, incorporou de maneira divertida ninguém menos do que Elvis Presley.
Depois de viver um de seus melhores papéis, o do jogador e pistoleiro tuberculoso Doc Holliday, no faroeste “Tombstone – A Justiça Está Chegando” (1993), seguiu a década de 1990 alternando poucos filmes memoráveis — “Fogo contra Fogo” (1995), “O Príncipe do Egito” (1998) — com produções abaixo da crítica, como “Batman Eternamente” (1995), “A Ilha do Dr. Moreau” (1996) e “O Santo”.
Nos anos 2000, Kilmer não conseguiu repetir o brilho do passado, com poucos papéis de destaque — entre eles, o astro pornô John Holmes em “Crimes em Wonderland” (2003), um agente do Serviço Secreto no thriller “Spartan” (2004) e um detetive gay na comédia policial “Beijos e Tiros” (2005), com Robert Downey Jr.

Em 2014, Kilmer foi diagnosticado com um câncer de garganta e precisou passar por intenso tratamento que incluiu uma cirurgia de traqueostomia. Embora livre do câncer em 2016, o ator nunca se recuperou da traqueostomia — procedimento cirúrgico que permite a passagem de ar diretamente dos pulmões sem atravessar as vias aéreas superiores —, sofrendo danos permanentes às suas cordas vocais.
DICA NO STREAMING: Todo o processo de luta de Kilmer contra a doença pode ser acompanhado no documentário “Val” (2021), disponível no Prime Video, que traz imagens raras filmadas pelo ator ao longo de 40 anos, entre registros pessoais e profissionais. Imagens de arquivo preciosas, incluindo ensaios na Juilliard School e bastidores de “Top Gun”, “Tombstone” e “A Ilha do Dr. Moreau”, são costuradas pela narração de Jack Kilmer, que dá voz às memórias do pai. Com um aparelho de traqueostomia instalado no pescoço, o astro relembra momentos de sua carreira, o impacto do câncer em sua vida e faz até uma autocrítica sobre seu comportamento em sets de filmagem e a fama de “bad boy”.
Em 2022, Tom Cruise resgatou Kilmer da aposentadoria forçada em “Top Gun: Maverick“, sequência do sucesso de 1986. Mesmo debilitado, o ator retornou ao papel de “Iceman” numa participação especial no filme, que utilizou inteligência artificial para recriar sua voz.
O reencontro dos dois antigos astros de “Top Gun – Ases Indomáveis” foi sua despedida emocionante nas telas. Val Kilmer foi um astro de carreira singular e personalidade difícil que enfrentou, como poucos, uma das maiores adversidades para um ator: a de perder a própria voz.
Mas sua voz e imenso talento continuarão para sempre, graças à magia do cinema.
CURIOSIDADES:
- Kilmer recusou o papel de Patrick Swayze em “Dirty Dancing – Ritmo Quente” (1987), porque não queria ficar marcado como “gostosão”.
- O ator desistiu ainda dos papéis de Kyle MacLachlan em “Duna” (1984) e “Veludo Azul” (1986), dois filmes de David Lynch. Kilmer achou o roteiro do segundo “pura pornografia”, mas depois se arrependeu da decisão.
- Outro papel famoso que Kilmer deixou passar foi o de Woody Harrelson em “Proposta Indecente” (1993).
- Kilmer e Marlon Brando (1924-2004) conseguiram tirar do sério o diretor John Frankenheimer (1930-2002) durante as filmagens de “A Ilha do Dr. Moreau” (1996). Frankenheimer prometeu nunca mais trabalhar com Kilmer de novo. O ator relembra sua experiência no set dessa tumultuada produção no documentário “Val” (2021).
Pesquisa e texto: Eduardo Lucena